terça-feira, 29 de julho de 2014

Dos aniversários

Aquele dia que o tempo rouba um pouco de você para ele, sem dizer quanto ainda sobra para você celebrar novamente, e acender mais velas, e receber a avó que vem de longe para comemorar com você, e comer mais bolos e receber mais tortas de limão. Aquele dia que nenhuma enxaqueca, nem prova, nem ressaca, nem vinho tinto, nem branco, nem falta dos pais vai tirar a alegria de um ano a mais de vida. Aquele dia em que experiência, mensagens, bolos, amigos, assopros, velas e a velha [e nova] maturidade estão contigo. Aquele dia que, assim como no ano novo, você tem novos desejos, faz novas promessas, um balanço da vida, da situação, do dia, das horas passadas. 

[Quando o inverno chegar eu quero estar junto a ti]. 

Aquele dia que você percebe que um quarto de século carrega lembranças, viagens, história, parabenizações, memória, das recordações mais belas às comemorações menos intensas, e ainda um futuro a ser compreendido. Aquele dia que você compreende novamente a beleza de uma verdadeira amizade e a graciosidade de determinadas atitutes de quem faz mais do que pode para ver você bem, seu ritmo, seu gosto, seu gesto, sua música, sua dança e, acima de tudo, sua felicidade. Internaliza o cuidado, o zelo mais sincero e o carinho mais belo de quem realmente se preocupa com o seu bem. É o dia em que um pouco da pureza da resposta das crianças vai embora, outro pouco permanece, porque é preciso, porque é difícil estragar, porque é o seu aniversário. 

[Quando o inverno chegar eu quero estar junto a ti] E ele chegou.  

Aquele dia em que você percebe que o seu tempo rouba um pouco [ou muito] do tempo dele. Percebe a importância de cada estação com ele, de cada carinho, cada dengo, cada chamego, cada cafuné; a semelhança de cada jeito, trejeito, modo, característica, gesto, gosto, atitude, música, dança, humor. Aquele dia que você percebe que não importa mais contar quantos quartos de século carregam lembranças, viagens, história, parabenizações, memória, recordações e um futuro a ser compreendido. Você compreende a beleza da semelhança [e também da diferença], da conquista, do passar do tempo, da persistência, da paternidade. É o dia em que um pouco da pureza da resposta das crianças vai embora, outro pouco permanece, porque é preciso, porque é difícil estragar, porque é o aniversário dele, do seu pai. 

[Pode o outono voltar... Eu quero estar junto a ti]

Aquele dia em que o tempo dela é também o seu [e será desde que você nasceu]. Aquele dia em que as lembranças novamente florecem e que primaveras separam idades [e unem vidas]. Você percebe a importância de cada ano com ela [365 dias, ou seja lá quantas semanas, horas, minutos ou segundos], cada estação, cada fração e pedacinho de tempo. Você compreende a beleza da diferença [e também da semelhança], da compreensão, da paciência, da fé, da persistência, do amor, do carinho da maternidade. É o dia em que um pouco da pureza da resposta das crianças vai embora, outro pouco permanece, porque é preciso, porque é difícil estragar, porque é o aniversário dela, da sua mãe. 

[Trago esta rosa... Para te dar] 

Aquele dia em que você percebe que pais e filhos apenas são [apenas se amam] no inverno, outono, verão ou na primavera. Porque não é primavera [é inverno]. Porque a rosa é deles [ou o roseiral]. Porque o amor é deles [e o maior do mundo].  

[Hoje o céu está tão lindo]



sexta-feira, 18 de julho de 2014

Flor de açúcar

Entre um gole e outro de seu chá predileto ela refletia. E sabia que, por mais que não quisesse, aquela flor de açúcar parecia se despedaçar. Talvez por luz, água ou solidão. Talvez a água fosse pouca, talvez muita. Ela apostava na segunda opção. Era cuidado demais para pouca pétala. Poucas, coloridas e sedosas, despediam-se... pétala por pétala, enquanto ela tentava rearranjar as flores naquele jardim de ensaios, anseios, receios, noites mal dormidas, refeições esquecidas. Naquele arranjo, ela ia perdendo a fome, as expectativas, as lembranças, as poucas esperanças e os acordes que restavam.


domingo, 11 de maio de 2014

Das vontades dos dias chuvosos (e frios)

É interessante como os dias chuvosos alteram nossas vontades. A vontade de ir à praia é substituída pela vontade de uma viagem à região montanhosa. O movimento, a agitação, a atividade e a ação sofrem com a alteração das vontades durante os dias chuvosos, nos quais desejamos parar, pensar, descansar, dormir, sentir o passar do tempo sem preocupações. Uma preguiça, uma vontade de viajar com os amigos e não precisar voltar logo porque o feriado está acabando, enquanto a chuva continua caindo. Uma vontade de cafuné, de carinho, de conforto, de um banho quente, de um filme, de coberta, de chocolate, de pipoca, de música erudita, de um leite com achocolatado na caneca predileta, de uma ligação de vó, de um biscoito de polvilho feito com o amor dela, de comer um pão quentinho com suco de caju ou de maracujá ou um pão de queijo com chá ou café. A vontade de ficar em casa à toa, mas de parar de pensar, de falar e de procurar a desejada comida. É surpreendente como os dias chuvosos transformam os programas, as comidas, as viagens e as vontades. Em vez de ouvir The Beatles no volume máximo e dançar Twist And Shout a noite toda, colocamos para tocar uma música mais lenta, mais calma, um som menos intenso e que faça acalmar a alma e lembrar pessoas queridas. É neste momento, no qual as nuvens dão o sinal de que vão continuar bagunçando o tempo, que sinto vontade de ver você. Não somente nesse tempo, tão chuvoso, tão fechado, tão nosso, mas confesso que nele que as vontades aumentam. Vontade de um abraço apertado e de ter levado o seu casaco na noite anterior para ter um pretexto para ver você no dia seguinte ou no próximo. Vontade de um pretexto, um contexto, um motivo para um novo texto, um concerto, uma caneca nova, um escrito seu para mim e outra canção.


domingo, 27 de abril de 2014

De lições e de partidas

Com você aprendi algumas coisas. Transformar momentos simples em cinematográficos é uma delas. E te deixar sem graça com esses momentos é outra. Dizer um adeus que não passa de até breve é mais uma das lições. Tantas vezes eu disse “Babe I'm Gonna Leave You” e aqui estou. Tantas vezes afirmei não escrever mais uma linha para você e aqui estou: digitando mais um trecho ao som de Dave Matthews Band. Outra lição é a importância da falta, do tempo, do carinho e de tantos outros substantivos que ficam ainda mais gostosos quando misturados com chocolate, sorvete e talvez um drink de maça verde. Aprendi que “Quadrilha” de Carlos Drummond nunca tinha feito tanto sentido na minha vida até então. Aprendi que nunca é tarde demais ou muito cedo para mais uma nota, uma anotação, uma música, um abraço, uma última cena de cinema. Por fim, aprendi que uma hora é realmente necessária a partida. Para que possa haver outro encontro, outro desencontro, outro reencontro, outra música, outra orquestra, outro nascer do Sol, outra Lua, outro poema, outra música novamente e também outro silêncio.


quarta-feira, 19 de março de 2014

Se você fosse meu

Não é porque a Lua está linda hoje que penso em você neste instante. E, mesmo distante, você me diverte e rouba meus pensamentos... Só queria que soubesse. Não é somente porque você merece. Nem por minha vontade, nem pela mudança de estações, anunciando o Verão a sua partida e também o futuro amarelar das folhas. Não é porque comecei a traçar um caminho que você me decepcionou com um mapa em branco, mesmo que ele não esteja tão alvo quanto você pensa. Não é somente por alguns momentos e acordes que escrevo, nem por cada canção que ouvimos juntos e pela sua atenção. A questão é que minha voz e meu piano sentem falta do seu violão. E depois de algumas doses de sakê, confesso... se eu estivesse no Céu agora, seria a Lua. E seria sua, se você fosse meu.


domingo, 16 de março de 2014

Dias da semana

De repente os dias da semana me dão saudade. Lembranças de algumas quartas-feiras que comprei flores e comi tapioca de banana na feira. Das quintas guardo as memórias do teatro, dos concertos ou dos escritos no concerto. Das terças guardo o piano. E de repente me dá saudade dele. E de suas teclas. Dele e de você, das notas que escrevia pra mim e dos nossos planos. Das saídas na chuva enquanto ainda nos conhecíamos e daquela inspiração constante que eu tinha ao pensar em nós. De repente sinto falta da gente, da minha fé, da fé em nós e em nossos laços. Da sua promessa e da minha... segredo nosso. Do abraço nem preciso dizer que sinto falta... indescritível. Das sextas ainda guardo a vontade de pegar a estrada e fugir pra montanha com você, dizendo, então, prepare a mala para fugirmos daqui. Sem pressa você arrumava seus pertences. Sem receio, partíamos. Dos sábados guardo a vontade de ir ao cinema sem antes me planejar com o tempo da sessão. De repente me lembro de alguns lugares e de algumas datas. Do nosso primeiro beijo, do cartão postal dos Beatles, das nossas músicas, das dedicatórias nos livros, ah, como você era bom nisso. Mas não ligue não, a saudade passa. Ou ligue, pois talvez se transforme. Mas não tem revolta não... das segundas guardo você novamente. 



sábado, 8 de março de 2014

Já basta

Eu sei que não me faz bem sacrificar o sono por acordes, mas me faz bem te ver. Eu sei que não me faz bem te ver esporadicamente, mas me faz bem pensar que um dia pode ser diferente. Eu sei que o diferente pode ter além de um anoitecer com árvores, violão e um beijo na sua mão cansada de tocar. Ou um lago com patos e a falta do luar. O passar do tempo, um reencontro, o Sol nascendo, a paisagem de um novo dia e algumas canções. Mas se o diferente for isso... já basta.





domingo, 2 de março de 2014

O voo

Ela, a cada instante, explicava um pouco de si para ele. Sentia que ele merecia ouvir cada vez mais sobre ela. E gostava da curiosidade dele em ouvir aquilo. Sentia-se especial por acreditar quando ele dizia que ela tinha um mundo de significações que ele ainda não havia decifrado. E o “ainda” dava mais sentido à vontade dele de estar perto dela. E sentido à vontade dela também. Aquele “ainda” ainda tornaria a presença dele mais querida. Porque aquilo poderia representar muitos caminhos... E vinha ele, tentar bagunçar o dela, como uma mistura de instrumentos diversos em uma única canção. Ele dizia que ela desfilava uma beleza singular com os olhos, com a voz, com o ritmo e confessava que construía em sua mente quem ela era com tantas surpresas e aventuras poéticas. E as reflexões sobre suas vidas levavam a crer que, embora ele dissesse o oposto, o que mais queria naquele momento era encostar delicadamente em seus cabelos e revelar a turbulência que desejava causar na viagem dela. E só de pensar naquele voo, ela já sentia um friozinho na barriga.


quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Incertezas noturnas

Houve um tempo em que ele queria ser para ela um príncipe real. Não de dinastia, nem de livros, mas de realidade, de toque e de outros sentidos. Ele a admirava por completo, repleto de amor e sinceridade. E ela compreendia aquilo minuciosamente. Naquele tempo, ele traçava comparações em estrofes. Entre ela e a música, a arte, o cinema, o teatro. Ele a comparava a um lugar, uma composição, um filme, uma construção, uma peça, uma dança, uma mudança. A um mosaico, um astro, um poema, um planeta, uma virtude, um solo. Ele desejava os beijos dela e queria aquecê-la quando pequenas gotas caíssem pela janela alterando a temperatura do ambiente. Se o tempo fechasse, ele estava lá para ela. Tanto para emprestar um casaco quanto para dizer um eu te amo e fazê-la sorrir em meio à tempestade. Acontece que a primavera havia passado, levando as flores daquele tempo. O verão também e o outono. Restando, das estações, os corações frios do inverno. E a primavera fazia falta para ela. Aquele tempo de aquarela, colorido e ensolarado. Ela sentia falta dos sorrisos, dos braços e abraços, do laço entre os dois. E até, às vezes, de um traço de descaso ou de encontra-lo por acaso. Sentia falta daquele que costumava admirar a graciosidade dos seus gestos e suas risadas espontâneas. Daquele que faria muito por apenas um beijo dela. Então, ela olhava, pela janela, o céu. Na caixinha, o anel... guardado. Perguntava a cada estrela se ela deveria considerar suas esperanças ou coloca-las sob o travesseiro e dormir. Os astros não tinham respostas e apenas diziam para que dormisse sem certezas.



terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Entrada sorrateira

Entrei na sua vida como quem chega sorrateiramente em algum lugar. O mar estava agitado naquele dia e o clima se transformava. Não sei ao certo o que me fez, por um instante, ser fria como aquele tempo de inverno, enquanto nosso terno sentimento parecia tão eterno, guardado a sete chaves talvez ao som de claves de uma partitura ao lado do piano ou numa caixinha de música. [...] E decidi voltar para o nosso lar. Então tudo parecia caminhar bem... e eu também. Para não acordar ninguém, tirei meus sapatos, abandonei meus saltos na porta e, antes que você notasse, já me instalava no nosso canto [...] e aquele lar era novamente nosso abrigo.