domingo, 13 de setembro de 2015

Nada mais justo

Certo dia, ela lera que “escrever é mais barato que tomar remédio”, pois amém! Nada mais justo que sua vontade de não descongelar congelados alheios, alimentar a alma de palavras, fazer delas um recanto de sentimentos presentes. Naquele dia, a alma dela se silenciara, inundada de palavras mudas e absurdas, mas que faziam cada vez mais sentido e um certo abrigo para não receber as entrelinhas de outra história qualquer, mas daquela escolhida.

Certo dia, ela sentira que não somente o sono aliviava as dores do coração, mas o canto, a dança, um encontro consigo própria e todo o encanto do cotidiano, da rotina. Sim, até com a rotina aprendera a importância do acaso, da imprevisibilidade, de algo que confronta o óbvio e conforta a monotonia de uma terça-feira modorrenta ou até de um domingo insosso. Nada mais justo do que uma sexta-feira ou do que um sábado, daqueles que todo mundo espera alguma coisa à noite. Nada mais justo do que dançar a noite toda. Nada mais justo do que amigos em casa e jogos de tabuleiro. Nada mais justo do que a música e o instrumento da preferência de cada um. Nada mais justo do que toda uma orquestra a tocar por aí ou em uma película, com ou sem tradução.

Nada mais justo do que o conforto, do que a cama, a calma, a acolhida, o abrigo, do que não olhar somente o próprio umbigo. Nada mais justo do que reconhecer que nem sempre a justiça opera, pelo contrário. Nada mais justo do que alimentar a si e ao outro, do que recriar a alma em palavras, blocos de parágrafos, escritos, espaços, espelhos, notas. Alimentar o que há de belo entre os homens, seja silêncio ou som, seja a escolha entre isto ou aquilo. Seja perder algo para ganhar além. Seja alimenta-se da pureza de uma criança, seja amor, alma, comida, contos, canções ou trechos. Nada mais justo do que um vinil e um vinho. Um amigo e um livro. Uma caixa ou além, um punhadão de memórias. Nada mais justo do que embriagar-se com Billy Idol “dancing with myself”; nada mais justo que escutar Oasis, um “live forever” que se desconhece, mas que é eterno enquanto dura. Nada mais justo que cantar Marisa no chuveiro, ou Tribalistas, e fazer da rotina do banho algo além. Nada mais justo que apreciar, inclusive, a tal da rotina, com música ou com muita, muita mesmo.


Certo dia, ela lera, relera, relatara, sentira, atentando-se para o mais simples do que há em cada gesto e sinal da natureza. Certo dia, ela escolhera escolher. Dia após dia, hora após hora e a cada segundo, como se não fosse quase, nem tanto, nem tão pouco, nem tão muito, mas o suficiente para si. Naquele exato dia, ela descobrira um mundo novo, que desvendaria aos poucos. Porque nada mais justo do que o que sentia. Porque a justiça nem sempre ultrapassa ideias ou papéis. Porque “justo” tem cinco letras e sentidos diferentes. Porque “justo” nem tem sempre tanta igualdade, pelo contrário. Porque, apesar de tudo isso, a justiça tem um quê de bela para cada um, ela só precisa ser feita. E, justiça seja feita, não ocorre sem um punhado de amor nos corações. 





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