Um dia a gente percebe que a saudade tem dessas coisas. Tem um pouco de tristeza, de arrependimento, mas também de beleza, lembranças, cartas, cartões, canções, situações, aceitações: de si, do outro e das situações. Risos, sorrisos e altas risadas, ou aquelas tidas e contidas. Dedicatórias, mimos, histórias, compreensão, memórias, sonetos, apresentações, poemas e poesia... Muita. Caixas pros cartões e, por vezes, decisões, recitais, flores e dúvidas. Diante delas, procuramos porquês, percepções diferentes, perfumes parecidos ou nem tanto, pares, olhares, lugares confortáveis e uma música que também nos conforte. Tentamos achar o tom, o som; o Tom; o Caetano; o Vinícius; o Toquinho com sua linda Aquarela; a Marisa com seu Verde, Amarelo, Anil, Cor-de-Rosa e Carvão ou com aquela carnavália toda dos Tribalistas ou com aquela Veeeelha Infância, enfim, tantos artistas e cores que mal posso elencar as de Frida Kahlo. Também temos a Adriana, o João, a Maria, a Elis, ou importamos Ella abraçando o Jobim no tom ou, ainda, a Stacey com sua voz doce como mel ou algodão doce. Uma voz tão tranquila quanto um barquinho a deslizar no macio azul do mar. Ah, a Stacey sim canta de forma encantadora, tanto em português como em francês ou inglês. A calma de verão do cantar dela dá para sentir não só pelo barquinho dela, O barquinho, mas também pelas Águas de março naquela voz, pelo seu Samba de Verão ou apenas por um Samba de uma nota só, basta uma. Tentamos achar também a Tiê, o Mário, o Vinícius de novo e, então, outra canção. A Lua, a amiga, o garçom e, finalmente, o Cosmopolitan que ele vai nos trazer... Ou um drink bom também, mas baratinho. Buscamos entreter a saudade, distrai-la e diverti-la para que não nos incomode com suas dores e com a solidão. E, se for para sentir a solidão, que seja assim, de forma agradável e por completo, sem alguém na outra linha que tente consolar ou entender sentimentos alheios. Afinal, a solidão pode ser algo tão bom quanto o silencio. Acontece que, um belo dia, nossas - e novas - cores procuramos pintar, notar, anotar, guardar, escrever, borrar sem querer, reescrever, entender e até antever. Um dia a gente percebe que a saudade carrega um encanto, um canto -na voz ou não- e um cantar que pode encantar em qualquer canto, como a Stacey faz em Nova Iorque ou no Rio... Vozes e instrumentos agradáveis em uma música brasileira, em uma bossa, em um samba. Vozes nacionais e estrangeiras, agudas, graves ou nem tanto; femininas ou masculinas. A saudade carrega cheiros naturais e de frascos, importados ou nacionais; jeitos delicados, indelicados, gratos por agrados, ou nem tanto; desejos, estes gigantes; instrumentos: de sopro, de vento, de corpo alma e tudo, de cordas, de toque, de percussão. Então aparecem os tambores, os triângulos (não exatamente como os das contas de matemática do ensino médio), os pratos ou até as panelas, vazias ou não. A saudade carrega também alguns laços e acordes. Para que eu acorde, tu acordes e ele acorde também. O réveillon está aí não é à toa, mas precisamos despertar antes. Then, after dreaming of you and me, nous nous réveillons. Que acordes para um acorde ou acordo matinal, tríades maiores ou menores no piano e as flores sobre ele, ou perto, espalhadas pela sala de estar. Cores, tentativas, experiências, excessos, distâncias, perdas, encontros, palavras, despedidas, palpites, laços, palavras, medos, males, mal-entendidos, verdades e faltas. Um dia a gente percebe que a saudade adormece, a gente vai esquecendo enquanto a música diminui, vai esquecendo, esquecendo e esquece. Amadurece e envelhece, seja com um fio de cabelo branco ou vários deles. Com tinta no cabelo ou nem tanta, o ciclo da vida vai passando com o passar das músicas. Elas tocam enquanto a gente toma um chá, ou vários deles, daí vem o refrão e repete tudo... Letras, músicas, filmes, sentimentos, trilhas, películas, salas de cinema e de aula, os escritórios e os escritos, as marchinhas e os blocos de carnaval, parentes e presentes do Natal, os aniversários e as festas, as conquistas ou as frustrações - às vezes inevitáveis - de algo que não ocorreu conforme planejado, enfim, o preto e branco ou o colorido da vida. Ou a vida, ora em preto e branco ora colorida.
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