quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

De aulas de inglês, arte, aromas, sentidos e de toda a poesia cotidiana


In(censo)

Con(senso)

Com censo ou sem censo?
Com senso ou sem sentido (aparente)?

(Con)sentir e Com sentir, por gentileza.

Destino, sim, eu assino

Em

baixo

da

arte.


Assinado: eu, Clarissa. 

















Desejamos, desde já, um belo 2017 a todos, com estudos, incensos, corações rosas, músicas, direito, engenharia, (amar)ula, danças, Telegrama, Zeca e outros tantos.












Ps.: Porque essa história de poesia e de tudo nela contido (arte, aromas e outros tantos) ainda nos levará além. Ao som  de Conversa de Botequim, na voz da Maria Rita.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

Nota (natalina) sobre elas


Literal como tal, uma delas precisava aprender a ler o silêncio (ainda), a ler nas entrelinhas a beleza do não dito. A outra delas, Clarissa, precisava aprender a desabençoar o excesso e a não transbord(ar).
Observe o copo d'agua, Clarissa! 


A outra delas estava hospedada numa casa em mudança, dançava ao som de bandolins, gostava de valsa e de outros tantos, encontrava-se com suas crianças internas, esperava dos espelhos nem tanto nem tão pouco, aceitava a primavera, a prima Vera, o verão, o outono, o inverno, o inverso, o verso, as versões diferentes, as inversões, o passar das estações, o invertido, o repetido e o inédito, inclusive. Porque quando o CD acaba, é necessário o silêncio (ou a falta de som em letras e blocos de notas) ou a troca das músicas.


E ela, agora, acabava-se de lágrimas. De salgado, agora, só as comidas natalitas. De Salgado, só o Sebastião, o gosto das próprias lágrimas, a água do mar, o rebrotar das flores (mesmo que a primavera tivesse findado com o nascer do verão). Porque o CD acabara e ela, agora, queria era se acabar de dançar e pôr a mão na massa, como pudesse, por um mundo que considerasse melhor. Porque dissera um grande querido que um bom parâmetro de felicidade é quando se chora mais de alegria do que de tristeza e ela acreditava em ambos, alegria e tristeza, como complementares. Além disso, tinha fé nos idosos, nas crianças, nos adultos, nos jovens, nos artistas, nos professores, nos pianistas, nos bailarinos, nos passarinhos, na energia e no sistema (solar), no luar, em cada lugar, no mistério dos planetas, nos recadinhos natalinos, nas festividades, no harmônico, na gratidão, na admiração, no conforto, no desconfortante conforto, nas pequenas mudanças, na simplicidade, na interdisciplinaridade e, por último, mas não menos importante, no canto.


Ao som de Logical Song: "There are times when all the world's asleep, the questions run too deep for such a simple man". Ps.: Um ingresso para um mundo melhor, por gentileza, que não se compra, mas se constrói.











sábado, 17 de dezembro de 2016

Não quero lhe falar meu grande amor: um dia a gente percebe e aprende...

Um dia a gente percebe (e aprende) que o passado fica no passado, por mais belo que seja, por mais belo ainda que seja no presente, quando o idealizamos maravilhosamente aquarelado. A gente percebe que, por mais que procuremos porquês em caixas, cartões, flores, fatos, receitas prontas, recitais, rimas, poemas, parágrafos, perfumes parecidos, profetas, poetas, pares, olhares, lugares e outros tantos, o que é nosso já está guardado, sobretudo em nosso coração. Um dia a gente percebe (e aprende) que, por mais bela que seja a nossa própria companhia e o conforto do nosso próprio coração, uma sessão de cinema solitária numa sexta-feira à noite nem sempre basta, mas sim o quarto de uma amiga, sobretudo com passarinhos e cobertas azuis nele, sobretudo com as duas, com as conversas, os relatos, os retratos que já têm juntas e os que ainda virão, as mesmas roupas que já não cabem mais, os mesmos olhos que já enxergam mais, visões diferentes das que tinham no passado e das que terão (muito provavelmente) no futuro e graças ao Deus de cada uma, mesmo que seja o mesmo e ainda que o cinema na sexta-feira e no sábado, em conjunto, agora ja sejam suficientes, pois há Neruda e Elis, em seguida, em cartaz.



Um dia a gente percebe (e aprende) que as pessoas que reclamam pela falta de amigos não o fazem à toa. Manter laços nem sempre é tão simples, mas necessário. Um dia a gente percebe (e aprende, e agradece, e deseja) que todos tenham sorte em relação às amizades de longa data, de alma, de fraternidade e de outros tantos. A gente percebe (e aprende) que não bastam as opiniões da mãe, do pai, dos irmãos, da avó, da titia, do papagaio, do cachorro, do gato se isso não tiver um filtro próprio amorosamente calibrado, para que a opinião alheia em excesso não anule a da própria pessoa. A gente percebe (e aprende), por vezes, que precisa se afastar de determinados amores, afetos, amoras, abraços e amizades para que floresçam ainda mais belos no futuro e que, se não florescerem, isso não é o fim, mas um indício de que o melhor foi o afastamento, então. Aprende-se que isso serve inclusive para a família, em determinados momentos, e que a espaçada distância não significa amor de menos, mas a manutenção de um respeitoso sentimento, ainda que contando com uma certa distância que preserve a saudade e que torne saudável um convívio mais próximo.



A gente toma chá, ri das próprias bobagens e de detalhes; a gente bate o martelo, primeiramente, sobre o fato de que nada pode rasgar um amor-próprio bem construído, de que o envelhecimento nem sempre caminha ao lado da sabedoria; de que nem todos aprendem com o passar dos anos a admirar as simples belezinhas da vida; de que, entre o livro e a sabedoria, a gente escolhe a segunda opção, por mais que ela possa vir da primeira, com frequencia. A gente deseja que todos evoluam e que amadureçam com sabedoria. A gente aceita o que não pode mudar (até a mudança não se tornar inviável e ser, de fato, viabilizada); a gente aprende a importância do silêncio, não porque outro alguém não quer conversa, mas porque a gente não quer. A gente aprende a dar satisfação a quem quer, quando quer e por querer.  A gente aprende que conselho é uma forma de nostalgia e até menciona isso ao dar conselho; a gente aprende a não largar tudo aquilo que nos faz bem e a afastar tudo aquilo que já não cabe no ritmo, nem no poema; a afastar tudo aquilo que não convém com o timig, afinal, quem somos nós para desconsiderar que o tempo tem o próprio tempo e que a música tem a própria dinâmica?


Por fim, a gente acredita em ideias das quais desacreditava por ainda não ter conhecimento suficiente (ou vice-versa; verso e vice); então, a gente bate o martelo (agora segundamente), e começa a aprender sobre a melhor forma de bater o martelo e de repensar, no presente, sobre (a importância d)o passado, ao mesmo tempo em que deixa o passado lá mesmo (entre reconsiderações presentes de/) para um futuro com tempo, espaço, espelho, escolha, local, imaginação ainda inéditos. Então, a gente agradece pelos frutos plantados, agradece por perceber que já começou a nadar, mas reconhece que ainda há muito pelo oceano a nadar. Reconhece que, mesmo que haja uma tampa para cada panela, às vezes é necessária a falta de tampa. Reconhece que não, não devemos subestimar a força de um novo aroma ou de uma amizade repaginada. Reconhece que quem faz do limão limonada vive mais leve e com um sorriso no rosto, ou vários deles, sempre que possível. E ai? Vai de limão, laranja, chá, chuva ou chuvisco?








sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Conserta-se em prol do mundo: heal the world

Ela acredita ser parecida com a dialética.
Se estiver errada, críticas são bem-vindas, desde que embasadas.
No mais, elas corrigirão (dependendo do corrigir considerado).



 "Ponta de areia
Ponto final
Da Bahia-Minas
Estrada natural

Que ligava Minas
Ao porto ao mar
Caminho de ferro
Mandaram arrancar

Velho maquinista
Com seu boné
Lembra do povo alegre
Que vinha cortejar


Maria Fumaça
Não canta mais
Para moças
Flores janelas
E quintais"

Ps.1: Vestindo a camisa (literalmente) e honrando-a, da melhor forma possível.


Ps.2: Ao som de Esperanza Spalding, por gentileza. Ao vivo e a cores, de preferência... Se possível.


quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Da beleza dos olhos infantis: a Maria que eu conheci estuda no Sagrado e a Helena eu não sei

Maria 1 - Você é bonita.
Maria 2 - Por que vc me acha bonita, Maria?
Maria 1 - Por que você é linda.

<3

<3

Maria 2 - Você parece comigo quando eu era pequena.
Helena - Você já disse isso.
Maria 2 - Desculpe.
Helena - Não, pode falar, eu gosto.

Porque sim, os fatos ocorreram, no Espelho e na quadrilha. Sobre sonhos, ensinar, inclusive às crianças. Sobre lágrimas, passarinhos livres e combinações separadas de voos, que retornam quando (e porque) querem, a vida vai passando com o passar dos passarinhos e o organismo, mais cedo ou mais tarde, recupera o brilho. As lembranças permanecem, mas com um olhar diferente com o passar do tempo. Então, enxugamos as próprias lágrimas e gostamos do salgadinho delas, pois se parecem com o do mar. E esta chuva que traz o cheio de terra molhada?


  Ps.1: Nunca se afaste de si para amar outro alguém. Ps. 2: I love you.





terça-feira, 22 de novembro de 2016

Do produto da ordem dos fatores (essenciais)

Como não ganho.compro
Como não compro.ganho
Quando não compro.troco
Quando troco.ganho

dAr, DoAr
Receber, trocAr
Um a um, dois a dois 1 < 2 
<3

E as coisas lindas, bem-vindas;
Por essenciais;
Nascem e, ainda que findas;
Não fenecem...







quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Da infância, do desconfortante conforto, da memória e de outros tantos

Há cerca de 12 anos, em um planeta muito muito distante, ouvi pela primeira vez essa coisa de “areia demais para o caminhãozinho”. Não entendia o motivo de ouvir aquilo: as pessoas, grandes e pequenas, têm mesmo necessidades de explicações. Perguntava-me: Por que este menino está falando isso? Para me afastar dele? Pois é tão pequeno quanto parece? Fato é que, ao repensar sobre o porquê da frase, naquele contexto, vejo que é perfeitamente possível seu sentido. Desde então, ouvi novamente a mesmíssima frase, mas poucas vezes. Graças a Deus, porque, se todos os homens achassem as mulheres que pretendem conquistar “muita areia pro caminhãozinho”, faltariam caminhões e a areia realmente seria excessiva. 

Como andariam as obras e as construções, então? Como caminhariam os amores, os laços e os abraços? Lado a lado, um a um, dois a, empate ou WO? Já dizia a música “Eu não quero ganhar, eu quero chegar junto sem perder, eu quero um a um com você”. Daí uma hora essa história de caminhão, areia e obra acaba e você encontra alguém para manter um jogo equilibrado, sem empatar a sua vida, a própria vida ou a alheia. Essa coisa de caminhão e areia, areia e caminhão (prefiro mesmo denominar coisa à palavra), perde o sentido e a logística se adequa. A areia não se encontra em excesso para o caminhão y, isso se fosse possível descrever o amor em função. 

Além disso, a função do amor (se é que ele tem alguma) não seria mesmo a de competição, em grau algum, pelo contrário, o amor pressupõe parceria, um chegar junto mútuo. Mas há quem diga que continuarão a calcular por aí o excesso de areia para determinado caminhão ou de certo caminhão para determinada areia... E isso foge ao meu controle, foge a minha competência, porque não desejaria cálculo assim nem se já não tivesse meu caminhão. Prefiro mesmo é brincar com as crianças. De todo modo, com caminhão ou sem, as pessoas grandes tentam compreender tudo e, para tanto, necessitam de explicações. 



Então, seja lá o modo de transporte – caminhão, trator, carro, bicicleta, a pé, teletransporte de/para outro planeta – as pessoas grandes são assim: “nunca comprendem nada por sí solas y es cansador para nos ninos tener que darles siempre y siempre explicaciones”. Um brinde, pois, às crianças, pois estas permanecem em alguns adultos e existem coisas lindas, para além das findas, que merecem permanecer.


“[...] What are men to rocks and mountains? Oh! What hours of transport we shall spend! And when we do return, it shall not be like other travellers, without being able to give one accurate idea of anything. We will know where we have gone - we will recollect what we have seen. Lakes, mountains, and rivers shall not be jumbled together in our imaginations; nor, when we attempt to describe any particular scene, will we begin quarrelling about its relative situation. Let our first effusions be less insupportable than those of the generality of travellers.''
Jane Austen.

P.S: dedico ao pai; aos irmãos que escolhi; aos homens que não medem a areia por saco, por volume ou pela capacidade do caminhão e, por fim, mas não menos importante; ao Pedro, que me ajuda a enxergar além das pedras, a partir das montanhas. 

domingo, 2 de outubro de 2016

Morar em amor ou em Roma

Se a paixão é um risco e o amor um rabisco
Ou vice-versa, verso e vice
Rabisco amor em amora, sem querer ir embora. Morar em amor ou em Roma, ao contrário. O Coliseu, o Camafeu, as asas que me deu ou não necessariamente.
Arrisco, arisco, esquivo, arquivo, há risco.
Remar em paz, palavras, frases, fases, luares, lugares
Distantes. Rabiscar, colorir, repintar, rimar com letra, alma, coração e calma.

Rima ou remo, amor e além, entre pressa, pressão, preguiça, perfeição, destino, fatalidade, banalidade, idade, razão ou a falta de.

Entre razão, coração, vice-versa, verso.
Versão, conversão, coração de novo, versar, conversar sobre
A idade para não ter razão, somente por vezes,
Entre sim, não, talvez,
Entre colibri, colo, jardim e laço,
Entre a água, o arroz, a colheita, a coleta,
Entre a larva, a borboleta, as estações, a primavera...
Morar em amor ou em Roma.


O Coliseu, o Camafeu, as guerras, a paz, a Itália, as asas, as casas, as cartas, as cores, as construções, as paixões, as habitações, os cristãos, os conflitos, os aquedutos, os relatos, os retratos, as fotografias, o passado, gente que foi – amor ou amora – embora. 
O jardim novamente, a bailarina, seu colã, seu colar, seu olhar, seu caminhar, seu passo, seu compasso, seu pas de deux.
Seu pas de chat, seu chá, seu planeta, seu universo, seu inverso, seu mar, seu infinito particular, seu astronauta, sem tradução. Roma, Coliseu, Vitória, vitórias, Camafeu, ágata ou água. 
Imortais e intraduzíveis.











Ps.: Inspirada por Os Paralamas do Sucesso, Pitty, Tiê e outros tantos. Tendo a Lua. <3

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Do glossário de Clarissa

Para Clarissa, aquele dia havia sido um daqueles em que a escrita a convocara, não a acadêmica... E não era possível negar. Então, ao olhar para a frente, começara a escrever e descrever a posição dos objetos. Vira dois passarinhos, um sobre a mesa da sala, outro sobre a gaiola sobre a mesma mesa. O passarinho sobre a gaiola foi feito de madeira. A gaiola sob o passarinho continha uma vela apenas e não ficava fechada, mesmo que não houvesse passarinho em seu interior. Clarissa olhara, através da cortina branca da sala, de um lado, para seus quatro mini cactos, tão fofos de tão minis, mas mais crescidos do que antes. 




Do lado oposto ao de seu pequenino jardim, olhara para a máquina de escrever, ao lado da orquídea e da sua mais nova caneca, com uma pequena flor dentro e escritos em seu exterior. Naquele espaço, neste texto e contexto, a máquina de escrever se posicionara sobre um móvel antigo, também de madeira, presente do pai, próximo a dois quadros nem tão antigos quanto a máquina preta de escrever. No móvel, parte de sua coleção de canecas guardadas, que aguardam novas xícaras, souvenirs, e quem sabe canetas, até então em outro espaço. Flores, fluxos, sons e quadros não faltam no ambiente, nem porta-retratos. Sobre o móvel antigo, três deles. Três miniaturas também e uma bailarina, apenas uma.



Não é novidade que cada um lida de forma distinta com seus próprio espaço, com seus compassos, passos, sentimentos, espaçamentos, contextos, circunstâncias, textos, lembranças e que, no decorrer do tempo, isso se altera. Clarissa era do tipo que gostava de dar e receber cartões. Comprava cartões nas viagens que fazia, sem destinatário em mente, para levar na mala e guardar em sua caixa de cartões e memórias, até que encontrasse a pessoa que fosse “a cara” daquele cartão x ou do y. Cartões em si, talvez não sejam tão belos, mas as palavras que preenchem cada espaço dos cartões sim... Essas sim! As letras, as linhas e a organização de letras em palavras, de palavras em frases, de frases e pontuações, até o final, constituem o cartão em si. 





Mas o mais importante são as emoções por detrás das letras, linhas e lições. Então, o que dizer sobre cartões aleatoriamente comprados, que se transformam em cartas, após escolhidos, a dedo, os destinatários? Eles completam o que as pessoas nem sempre dão conta de dizer pessoalmente, em voz alta e claramente. Eles, os cartões, revelam momentos pontuais de um sentimento, ou de vários deles, que perduram ou se modificam, de alguma forma, a se guardar na memória por meio de algo além de um papel. 


É como se cartões fossem glossários de sentimentos, ao traduzirem emoções um tanto quanto obscuras, por vezes, em ordem cronológica, quando datados, os cartões, em palavras a serem lidas e, além, interpretadas. É como se fossem dicionários de sentimentos. O que dizer de um tradutor de substantivos, sentimentos, satisfações  e outros tantos? Se o glossário fosse de Clarissa, traria no início, admiração, afago, afeto, alegria... E amor, claro! Admiração, entre fotos, fatos, canções e afetos, o Sol lá fora já posto, as nuvens em movimentos lentos, a chuva passada, aquela que levou o cheiro de grama molhada da cidade. No dicionário de Clarissa, posicionava-se a admiração logo no início, caminhando lado a lado com o amor, em dias nublados ou nem tanto; chuvosos ou nem; em noites mal dormidas ou nem.



Há quem diga que um glossário de sentimentos deve, necessariamente, preservar para todo sempre a palavra Amor. Ah, o amor, esse contentamento descontente; esse mote de poemas; essa ferida que dói e não se sente, mas por vezes sim; esse sentimento desejado por muitos; vivenciado inclusive pelos relutantes, que não o desejam; descrito por poetas, relatado, escrito, traduzido de diversas formas e experienciado por reles mortais. Há quem diga que um glossário assim não é feito de um ABC qualquer, pelo contrário, requer dedicação e um punhado de canela e cor no coração, desde o início, preferencialmente. 



Há quem diga que bom mesmo é se o glossário, depois do C, de coração, não contivesse o Desamor, escondido na mala da esperança de se tornar um dia outra coisa, desde que Bela, entre as letras A e D. Culpa e Compaixão começam com C, mas não valem. Decepção e Dó, esquece-se, embora existam. Só o dó do piano que cabe no glossário de Clarissa. Logo após, já na letra E, vem a esperança, não necessariamente em forma de inseto, não necessariamente pintada de verde, mas acompanhada, muitas vezes, da expectativa. E sobre Expectativa, o que dizer, por sinal? 


Pois bem, elas sinalizam que podem vir Decepções pela frente, embora no glossário as Decepções estivessem antes, ainda na letra D. Daí vêm as letras F, com suas Frustrações e G, com toda a Gratidão que houver nessa vida, um punhado maior de Amor e alguma dose de Antimonotonia. Do I o glossário inventa que não há inveja no mundo e nem infelicidade, até que se prove o contrário, acha-se graça daí. Clarissa, em seu glossário, pula algumas consoantes, J, K, L, M, N, e também a vogal O, já que o Ódio, a Ostentação e as Mágoas merecem morar longe. Chega-se, então, à letra P. 


Bom mesmo é que o glossário nunca contivesse algum Ódio ou sentimento similar, mas o Perdão logo após o O compensa. Poderia conter, ainda na letra P, paixão de sobra, mas essa não se cobra, não se empresta, não se vende, nem se negocia, apenas leva à beleza e à inquietude.



Se fosse musical, o dicionário de Clarissa conteria O Quereres do Caetano, ou no R, “aqui, ali, em qualquer lugar", a Rita, a Lee, cantando Beatles em forma de bossa. No S, o glossário de Clarissa seria composto por diversos sambas. Um salve inclusive ao Saravah, afinal é melhor ser alegre que ser triste e a alegria está no início. Nos arredores do T, teria tanto a dizer o glossário de Clarissa... Cantaria até um pouco de tristeza, só para fazer um samba com beleza, esquecer o Sofrimento do samba e afastar qualquer Tédio. Ao passear pelas letras U, V, X e Z, Clarissa lembraria nada mais nada menos que seu glossário é apenas um tipo de dicionário e que os sentimentos são um tanto complexos para breves descrições formais. Como tal, glossários desconhecem o significado de muitos verbetes que os humanos insistem em traduzir, abreviar, citar, colorir ou descolorir, concordar, desenhar, desdenhar, desenvolver, desfazer, editar, deletar, pintar e pluralizar. No vocabulário dos glossários, cheios de substantivos, os sentimentos talvez não levem outros tantos, como nos cartões com destinatários e nas cartas.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Da carnavalia de Clarissa, o que importa?

E por aquele carnaval Clarissa se apaixonaria... Para Clarissa, aquele era um carnaval em que não esperava nada além do próprio encontro consigo, de um punhado de amor-próprio, de estudo, além de meia dúzia de ovos na geladeira, um suco de caju, maracujá ou manga; uma ida ao supermercado - apenas uma bastava -  ou ao cinema, ao qual uma não bastaria. Ela, que fazia tapioca de banana e que, por vezes, ia à feira de quarta-feira, que não estava à toa na vida, que não pensaria ver a banda passar cantando coisas de amor, viu além... Viu várias bandas passarem, viu a Julia, a Luiza, o Vitor; ouviu as marchinhas, ouviu o Chico e o Gil e mais... Talvez não tivesse escutado tantas canções e coisas de amor cantaroladas, mas quem liga? Deixe ela dançar, a menina dança. 

E quem sabe amanhã ou depois tudo não voltasse ao normal?! A casa em ordem, a papelada, a pipocada, os pastéis e mais papéis, os artigos, os móveis antigos, a máquina de escrever, a decoração com flores, a falta dos blocos, das marchinhas e daquela carnavalia toda preenchendo a avenida. As louças, os livros, os lenços, as legendas e traduções dos filmes e das conversas, os confetes, os doces, os detalhes, os desfiles, os discos, os dissabores e sabores da vida, enfim, tudo aquilo que se pode guardar, inclusive na memória, inclusive de um ano desses que a memória não deleta nem por reza. E para quê deletar? 

Para Clarissa, não importava se a normalidade do amanhã não viesse tão recheada de Chico ou de qualquer marchinha de carnaval digna de se guardar como lembrança a sete chaves, nas fotografias, nas fantasias e nos retratos nem sempre tão pequenos daquela carnavalia. Não importava se o amanhã viesse, ao invés disso, acompanhado por uma monotonia típica de uma segunda-feira. 

Naquele dia, não importava, poucas horas valeriam o carnaval por completo, mesmo com o tempo de estudo, mesmo com todo o calor do verão, mesmo com os afazeres domésticos, com todos os "embora" e "contudo”, com todos “todavias” e “poréns” de todo o dia. Naquele instante, naquele carnaval, os olhos de Clarissa brilhavam mais do que as porcelanas de sua estante; o sorriso dela parecia tão colorido quanto um arco-iris e estava preenchido por um misto de sentimentos, como de cores, detalhadamente enriquecidos pela presença dos amigos, das canções, das fotos novamente, dos fatos, de bandas esperadas, de músicos inesperada e aleatoriamente preenchendo a rua toda de positividades e daquele clima de carnaval de noventa e tal. 

O resultado daquela mistura não era tão preciso, pois a exatidão para Clarissa nem sempre bastava e ela acreditava que a reza e a escrita não eram tão próximas da matemática quanto a música. O resultado daquele misto de sentimentos não era tão preciso, embora precioso fosse. E Clarissa teria sido abordada por alguém que se lembrara dela de outros carnavais? Quem é ela, quem é ela? E Clarissa confessava a si mesma o quanto a escrita descrevia os frutos daquele feriado prolongado. 


Lembrava-se da frase “Kafka fez da arte sua reza” e rezava intensamente em formato de palavras inundadas por rimas e ritmos... ao colocar no papel linha por linha, letra por letra, emoção por emoção, o que sentira naquele carnaval, que logo voltaria ao normal, mas que iria além de Chico e de canções de amor.

Ps.: "Vem pra minha ala que hoje a nossa escola vai desfilar. Vem fazer história que hoje é dia de glória neste lugar. Vem comemorar, escandalizar ninguém.
Vem me namorar, vou te namorar também. Vamos pra avenida, desfilar a vida, carnavalizar", já dizia a música.

"Eu conheci uma guria que eu já conhecia de outros carnavais, com outras fantasias", respondia o outro som.



segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Ai de ti, bem-te-vi

Bem-te-vi
Na brisa
Em que, concisa e imprecisamente, te perdi.
Bem-te-vi
Belo, amarelo, construindo elos e castelos
De som.
Cantando porvires, amanhãs
Encantando as manhãs
Sonoras e sonolentas.
Bem-me-vi
Imersa em ti, ainda, ao acordar.
Ali, avistei flores, vislumbrei voos e pássaros.
Ali, estática fiquei
Ali, permaneci.
Aqui, em meu sono dorme, enorme
O que os sonhos se encarregam de cuidar
E aqui, ai de ti, de me lembrar que te esqueci
E aqui, ai de mim, de me esquecer
Que, outrora, bem-te-vi.